segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Uma bomba às oito e catorze

Quinta-feira, oito horas e catorze minutos da manhã. Tensa manhã. Eu estava, durante aquela aula, mais irritada do que nunca. Meus pensamentos estavam martelando meu crânio maciço com tamanha força que jurava poder sentir a dor. Tudo bem, eu sabia que em algum momento ia passar ou aquele, o qual estava me irritando, haveria de se tocar. Incessantemente “bla blás” saíam de sua boca em tons graves e fortes, por mais baixos que pudessem ser. Eu não entendia o que era dito, então eram “bla blás” infernais. Minha cabeça já não era mais martelada e funcionava agora como uma panela de pressão: parecia que a qualquer momento explodiria e a pressão interna era grande, grande, grande. Eu me revirava escutando aquele som gutural saindo da boca do homem moderno, mas me revirava de pura irritação. Coça, coça, coça sem ter nenhum prurido. Talvez meu couro cabeludo já estivesse muito vermelho e meu cabelo, muito bagunçado. Não conseguia prestar atenção na aula de maneira alguma, mas tentar nunca era demais. Respondi, ou melhor, tentei responder oralmente às perguntas que a professora fazia e percebi que em meio a tanto tormento algo havia entrado em minha cabeça. Não sei. Cutuquei a garota do cabelo cacheado que sentava na minha frente e reclamei. Ela me fez algumas perguntas, observou aquele que me irritava e novamente voltou a me olhar. Explodi calmamente. Decidi mudar de lugar e arrastei a carteira, sem me levantar da cadeira. Rapidamente me ajeitei e fiquei ali, com meus pensamentos, bem na minha. O sinal que, cada dia parecia mais alto e insuportável tocou e acabou-se o tormento infernal.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Uma visita um tanto quanto inesperada

Psicose Nova-Iorquina - Capítulo VII

“Eu escutei a porta abrir e fiquei surpresa com a visita.”
- Oi.
- O que está fazendo aqui?
- Não iria deixar minha amiga na mão.
- Ninguém te avisou Átila, como você sabia da minha situação se não estávamos nem se vendo?
- Não interessa Mel, mas não vou deixar você sozinha enfrentando isso, não mesmo. Se precisar é só falar. Eu estou de carro, se quiser busco roupas ou qualquer outra coisa que precisar.
- Nesse momento não preciso de nada, mas obrigada.
Melina puxou uma cadeira e colocou perto dela. Átila sentou-se e ela contou desde a história do programa envolvendo o advogado até o suporte que ele estava dando naquele momento. Sua mãe começou a se mexer na cama. Levantou-se e foi a seu lado.
- O que eu estou fazendo aqui?
- Você quase vomitou o próprio fígado. Como tenho uma mísera compaixão por você, cuidei para que fosse internada. Sabe aquele advogado para quem deu? Agradeça a ele, pois está nos ajudando muito.
Melina saiu do quarto e bateu a porta. Átila levantou-se e foi até Rita.
- Ela está muito nervosa, de verdade. Por favor, desculpe-a.
Ela acenou com a cabeça e voltou a dormir. Parece que não se importou muito. Átila encontrou a amiga sentada na calçada, com a cabeça entre as pernas. Ele chegou e sentou ao seu lado, puxando seu corpo para cima. Abraçou-a.
- Chore Melina, você não é mulher maravilha, não pode continuar calada, aguentando tudo ou não.
Chorou silenciosamente e suas lágrimas transformavam seus olhos em duas pérolas negras, brilhantes.


***

Passaram-se alguns dias e a mãe de Melina teve alta. Ela fez questão de quebrar todas as garrafas de bebida de sua casa, jogou fora os maços de cigarro, ajeitou aquele inferno. Aspirou a casa, jogou os lençóis fedidos fora, abriu as janelas e deixou o sol e o vento fresco entrar. O ódio que sentia ainda não havia sido diluído e estava fazendo aquilo por conta própria, sabendo ou não se Rita queria.
- Não sei qual a finalidade disso tudo, filha.
- Não me chame de filha e cale a boca.
- Você deve me respeitar menina!
- Se eu pudesse teria dado um tapa nessa sua cara. Você é uma ingrata. Aposto que já voltou a dar. Tanto esforço para nada.
- Não me tire do sério Melina, eu sou sua mãe.
- Não, você é uma vadia! Mãe de verdade não faz o que você fez a vida toda.
Dizendo isso foi para seu quarto, enfiou umas roupas em uma pequena mala, pegou sua mochila, algumas outras coisas e saiu. A vizinhança ouvia os gritos.
- Onde você vai?
- Para qualquer lugar longe de você e deste inferno. Foda-se!
Melina acenou para o primeiro táxi que apareceu em seu caminho e foi para a casa de Átila. O amigo abriu a porta assim que ela chegou, olhou-a espantado. Ela começou a falar antes mesmo dele respirar:
- Preciso passar alguns dias aqui. Se precisar, faço hora extra no restaurante para pagar comida, água, luz, telefone, seja o que for. Ajudo a limpar casa, faço compras, qualquer coisa.
- Massagem em mim?
- Viado.
Só Tilanga mesmo para fazê-la rir. Ela entrou e instalou-se na casa dele.

A droga mais potente que qualquer outra

Psicose Nova-Iorquina - Capítulo VI

Talvez eu seja facilmente notada, notada por esse jeito não social, apenas sociável. Talvez ser tão “fechada”, tão calada possa me fazer mal. Minha vida está uma droga e sinto que aos poucos vou perdendo uma parte de mim. Primeiro brigo com Átila e agora minha mãe cai doente na cama. Estou sem meu melhor amigo, minha mãe e embora possa contar com Lavínia e Verônica, a vergonha sempre me deixa sozinha. Minha mãe bebe muito e por isso ela acabou desenvolvendo problemas sérios que necessitavam de internação, tratamento e medicamentos. Não temos grandes condições e apesar do quadro ser inicial, não possuimos muito dinheiro ou qualquer outro tipo de recurso para tratá-la. Estava utilizando a lista telefônica e lembrei de um advogado que minha mãe contratou a muito tempo atrás. Contratou só porque deu para ele. Biscate, falo isso porque sei o motivo dela ser tão afastada da minha vida, de sair a maior parte do tempo, de esquecer que me colocou no mundo e agora está ai, morrendo. Ela deveria me agradecer, pois poderia muito bem deixa-la morrer. Realmente ainda resta algo bom em mim. Liguei para o advogado:
- Doutor Daniel Liroff, sou Melina, filha de Rita.
- Rita...?
- Rita Vedova.
- Ah sim, em que posso ajudar?
- Poderia falar com o senhor pessoalmente em seu escritório?
- Posso atende-la as duas e meia.
- Estarei ai. Até breve.
Minha mãe estava no hospital em observação. Ela passou mal e foi levada. Não sabia por quanto tempo ficaria lá ou se seria internada de uma vez por todas. Sai de casa duas horas e passei no restaurante para falar com meu chefe. Liberou-me, mas tive um pequeno desconto no salário. Isso era o menor dos problemas. Cheguei no escritório, um lugar muito bem decorado, simples mas imponente. Um ambiente sério, silencioso. Esse silêncio causava até desconforto, confesso.
- Sente-se.
- Obrigada.
- O que a traz aqui, senhorita Verona?
- Melina, por favor. Bem, minha mãe está com problemas de saúde e como sou menor não posso fazer muito por ela. O médico disse que ela precisa de internação, precisa de medicamentos e tudo isso deveria ser feito por alguém que respondesse, legalmente, por mim. Não tenho ninguém, então estou pedindo ajuda ao senhor.
- Olha, pode demorar para conseguir algo realmente eficaz, mas posso assinar papéis para internação. Dado este primeiro passo, veremos a situação e faremos o que for preciso. Claro que a colocarei a par de tudo, quanto a isso não se preocupe.
- E quanto essa ajuda custará?
- Falaremos disso depois.
- Desde já agradeço.
Apertei a mão dele e sai. Fui para o hospital e o médico confirmou a necessidade da internação. Falei com ele e fui passar um tempo com ela. Quando cheguei no quarto, ela estava deitada em uma maca, pálida. Vê-la naquele estado partia meu coração, embora ela não fosse a mãe que gostaria de ter e nunca seria. Quando foi mãe? Ela estava sedada e eu sentei em uma cadeira, olhando ela, pensando nessa droga de vida. Apoiei meus cotovelos nos braços da cadeira e segurei minha cabeça, de olhos fechados, querendo apenas respirar aquele cheio de hospital e esvaziar minha cabeça, sem pensar em absolutamente nada. Eu escutei a porta abrir e fiquei surpresa com a visita.